quarta-feira, 31 de agosto de 2011

O autoconhecimento



A busca do ser humano por respostas sobre a natureza e as coisas, a vida e si mesmo, já remonta de muitos e muitos séculos.

No século V a.C. o filósofo grego Sócrates, já se preocupava com isso e dizia que antes do homem se preocupar em querer conhecer a origem da natureza ou das coisas, deveria primeiro procurar conhecer-se a si mesmo.

No pórtico do templo de Apolo, estava gravada a expressão “conhece-te a ti mesmo”, que se tornou a bandeira do filósofo grego.

Sócrates andava pelas ruas e praças de Atenas; pelo mercado e pela assembléia, indagando as pessoas: “Você sabe o que você diz?”, “Você realmente tem certeza em que você acredita?”, “Você está realmente conhecendo aquilo em que acredita, aquilo em que pensa, ou em aquilo que você diz?”

Fazendo estas perguntas as pessoas, Sócrates deixava seus interlocutores embaraçados, curiosos, irritados e na maioria das vezes surpresos, pois quando estas pessoas tentavam responder ao filósofo suas indagações, percebiam que na maioria das vezes não sabiam responder e que nunca tinham verdadeiramente parado para refletir em suas crenças, valores e ideais. Logo em seguida as pessoas esperavam que Sócrates respondesse à elas o objeto de suas indagações, no que o filósofo respondia: “Eu também não sei, e é por isso que estou perguntando.” De onde surgiu a célebre frase atribuída a ele: “Tudo o que sei é que nada sei”.

Sócrates dava uma prova de humildade e sabedoria, afirmando a consciência da própria ignorância.

Por questionar as idéias, os valores e os comportamentos que os atenienses julgavam corretos e verdadeiros, estimular o povo e principalmente a juventude ateniense a pensar e refletir se todos aqueles valores da época eram verdadeiros, Sócrates foi considerado um perigo pelos poderosos de Atenas.

Acusado de desrespeitar os deuses, corromper a juventude e violar as leis, como todo mártir, Sócrates foi condenado a morte.

Negou-se a defender-se perante a assembléia, e quando interrogado pelos discípulos pelo porquê de sua decisão, disse: “ se eu me defender, estarei aceitando as acusações, e eu não as aceito. (...)”.

A filosofia de Sócrates deixou marcas tão profundas no pensamento humano, que ele foi considerado pela maioria dos filósofos o pai da filosofia; Kardec colocou na introdução do Evangelho segundo o Espiritismo o resumo de sua doutrina e do seu principal discípulo – Platão - e Emmanuel afirma no livro A Caminho da Luz que: “Sua existência, em algumas circunstâncias, aproxima-se da exemplificação do próprio Cristo.(...)” 1

Mas transportando a essência do pensamento de Sócrates para os nossos dias, será que atualmente o homem e principalmente nós espíritas, conhecedores de tantas verdades do mundo espiritual, conhecemos à nós mesmos?

Qual será o móvel de nossas ações perante a Doutrina Espírita, nossa família, a sociedade e mesmo perante à nós mesmos?

Sabemos que somos imortais, mas será que nas horas de crise ou nas situações difíceis, temos sabido manter a calma daquele que sabe que toda tempestade chega e passa e que por mais que a noite seja densa, não há nada que possa impedir o nascer de um novo dia?

Temos consciência que reencarnamos para o resgate dos débitos do passado e o conseqüente desenvolvimento intelecto-moral que todo espírito carece, mas temos sido capazes de manter as esperanças diante da debilidade orgânica crônica, das pessoas que estão ligadas a nós e que não mantemos afinidade, da situação econômica difícil, da insatisfação de sonhos que gostaríamos de realizar, mas que as circunstâncias nos impossibilitaram de faze-lo?

Hoje compreendemos que em nossa jornada evolutiva não fizemos apenas amigos, antes mesmo prejudicamos e perseguimos muitas pessoas, mas diante das criaturas que hoje demonstram aversão por nós, temos demonstrado a humildade e o amor exemplificados por Jesus visando a reconciliação necessária, ou estamos acalentando animosidades que apenas dificultarão nossa situação no futuro?

Kardec deixou claro que fora da caridade não há salvação, mas temos nos esforçado em doar algo de nós em favor do nosso semelhante, ou temos exercitado a falsa bonomia, achando que alguns trabalhos assistenciais realizados uma vez por semana nos descortinarão as portas do paraíso?

É por tudo isto, por todas estas grandes verdades que os espíritos trouxeram para os homens através de Allan Kardec, e posteriormente em nosso século, pela psicografia de Francisco Cândido Xavier - com obras tão elucidativas como as de André Luiz e Emmanuel - cujas deste último expressando um alto teor evangélico, apresentando o Espiritismo como o próprio cristianismo redivivo, que constatamos que nós espíritas temos uma responsabilidade muito grande perante a vida, pois nenhuma outra religião explica os mecanismos da existência tão claramente quanto a nossa, em nenhuma outra existe um evangelho tão claro, onde são elucidadas até as mais alegóricas parábolas de Jesus.

Daí a necessidade do autoconhecimento pregado por Sócrates, que foi também abordado no Livro dos Espíritos 2 por Santo Agostinho, como a maneira mais eficaz de se melhorar nesta vida e se resistir ao mal.

Na subdivisão da pergunta 919 do Livro dos Espíritos, Kardec pergunta aos espíritos qual é o meio para se chegar ao autoconhecimento e na resposta que se segue a formulação da pergunta, se aconselha a interrogarmos a consciência ao final de cada dia, passando em revista o que fizemos e perguntar a nós mesmos se não faltamos com o cumprimento de algum dever e se ninguém tem motivos para se queixar de nós. Aconselha ainda a indagarmos de nós mesmos o que estamos fazendo e qual o móvel de nossas ações, se estamos praticando ações que censuraríamos nos outros e que não teríamos coragem de confessar. Se ao entrarmos no mundo dos espíritos – onde nada é oculto – teríamos medo do olhar de alguém. Que devemos analisar nossos atos e examinar o que podemos estar fazendo contra Deus, depois contra o próximo, e por fim contra nós mesmos.

E o espírito comunicante finaliza categórico:

“O conhecimento de si mesmo é, portanto, a chave do melhoramento individual.”

Todos nós somos criaturas humanas, passíveis de erro e por isso mesmo tudo isto aqui exposto sensibiliza antes a nós mesmos. Mas precisamos compreender que o Criador nos atribuiu apenas a imortalidade, nos concedendo todas as possibilidades para o progresso intelecto-moral, mas que este só pode ser efetuado por nós mesmos, visto sermos dotados de livre-arbítrio, que é a faculdade de fazer ou não fazer, o poder de decidir entre o bem e o mal. Sem o estudo do Evangelho e o conhecimento das verdades espirituais; sem o trabalho que aprimora a alma e sem o conhecimento de nós mesmos, fica muito difícil palmilharmos o caminho da luz. Talvez daí todos os erros cometidos nestes dois mil anos por aqueles que sucederam a vinda do Cristo, pois se não conhecemos a nós mesmos, mais complexas se tornam as palavras do Mestre:

— “Conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará.”

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